Memórias e emoções 613z5z

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Por Suzi Aguiar 3i6u41

Aqui em cima tudo está escuro, as pessoas dormem, embora inquietas pela posição desconfortável das poltronas apertadas do avião. Pela minúscula janela dá para ver lá fora as estrelas brilhantes e me perco em emoções.

Gosto do silêncio da madrugada. Gosto de estar sozinha apenas eu e minha companhia. Preciso muito desta quietude, porque meu coração está acelerado e eu não consigo dormir. É como se eu o ouvisse agora. E ele fala de um amor gigante que eu nem sabia que existia há um tempo.

Fecho os olhos e penso comovida: Está chegando a hora da gente o ver ali, na nossa frente, correndo para nos abraçar. E vamos abrir os braços, nos abaixarmos para pegá-lo no colo e rodopiar bem no alto, como quando bebê.

Estávamos afastados por dezesseis longos meses, mas o tempo não parou por isso. Nosso gurizinho agora é um menino grande. É um molequinho que conta piadas, faz charadinhas para depois dizer “enganei o bobo na casca do ovo”. E o nosso sorriso vai de orelha a orelha.

Amo ouvir suas palavras doces escritas na minha memória. Mas me entristeço porque perdemos a magia de vê-lo evoluir na fala atrapalhada dos primeiros tempos. Esta tristeza é o preço por termos perdido a chance do convívio bem de pertinho devido à pandemia. Esta praga que se espalha e vai devastando vidas, tolhendo o prazer, as alegrias e até os conflitos da convivência entre nossos pares.

Aqui, quietinha, penso no quanto perdemos. O COVID-19 nos roubou a delícia cotidiana de sermos avós. Nos tomou o gosto de sentarmos no chão para contar histórias, jogar o mico, ensinar a pular amarelinha e a andar de bicicleta. Furtou a alegria de, ensopados, darmos risadas na guerrinha de pistola d’água. Me tirou, especialmente, o prazer de ensiná-lo os segredos que as letras guardam nas folhas de um livro.

Para uma professorinha aposentada que sou, talvez a mais importante alegria roubada. Assim como alfabetizei muito cedo os três filhos, porque não me conformei, em apenas assistir de camarote esta que é mais bela e fascinante aventura que podemos ensinar para os pequenos.

O avião sacode devido à turbulência e me afasta das coisas tristes que perdi.

Logo estaremos em solo português, em quarentena por 14 dias. Confinados, mas com um pedaço da nossa família que mora lá, bem pertinho. Isso vai ser bom demais!

Vovó e vovô estão com a mala carregada de presentes. Muitos livros, alguns brinquedos, roupas, calçados, kinder ovo, pacote de pirulito e de balas mesmo com proibições. Afinal avós que se prezem, precisam criar segredinhos e combinados.

Alguém aí discorda?

É na infância que se criam cumplicidade e amor. Então te pergunto: que tipo de memória você está criando para o futuro de seus netos?

Publicado em 6 de agosto de 2021

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